Entrevista exclusiva com o guitarrista e vocalista da banda Dorsal Atlântica, CARLOS LOPES!

Entrevista exclusiva com o guitarrista e vocalista da banda Dorsal Atlântica, CARLOS LOPES!

October 1, 2020 0 By Geraldo Andrade

Conversamos com uma das maiores lendas do metal nacional, o guitarrista e vocalista, CARLOS LOPES da DORSAL ATLÂNTICA, que nos atendeu diretamente de sua casa no Rio de Janeiro, via Skype, e contou sobre a trajetória de uma das primeiras bandas de thrash metal no Brasil. Check it out!

Escutar histórias diretamente de um dos pioneiros da cena de metal nacional é realmente um privilégio. CARLOS LOPES fez parte da história do rock pesado brasileiro com sua banda carioca Dorsal Atlântica que começou as atividades em 1981, lutando contra todas as dificuldades e preconceitos da época e lançando um split álbum ‘Ultimatum’ juntamente com a banda Metalmorphose. O primeiro full álbum oficial da Dorsal, ‘Antes do Fim’, saiu em 1986, mas a banda ganhou mais notoriedade no ano seguinte com ‘Dividir & Conquistar’, inspirando toda uma geração de cabeludos pelo Brasil afora. Em 2001 a banda entra em um hiato sendo reativada somente em 2012 e desde então lançou três discos, impulsionados pelos fãs em forma de crowfunding, e está preparando seu mais recente trabalho “Pandemia”, com foco voltado para suas raízes brasileiras, que também são retratadas nas suas histórias em quadrinhos ‘Tupinambah’. Fomos conversar com Carlos Lopes e ouvir tudo que está rolando. Check it out!

carlos lopes dorsal atlantica

Foto Divulgação Carlos Lopes

Eduardo: É um prazer e honra falar com você Carlos!

Carlos: O prazer é meu, eu sou um cara muito recluso, não saio de casa há muitos anos, trabalho em casa, então essa pandemia não mudou minha vida. 

Gema: Primeira vez que vi você e sua banda foi numa edição da revista metal, acho que em 1982 ou 1983.

Carlos: A gente começou muito cedo, ainda não existia a cena, talvez uma cena pequena em SP, mas a gente não sabia, ouvi falar do Vulcano e do Stress de Belém do Pará, mas naquela época o Rio tinha uma cena artística maior. Fui na galeria do rock em São Paulo e comprei o ‘Live’ do Vulcano em 85 e eu acho que foi tudo muito rápido, todo mundo fazia as coisas acontecer, você tinha que correr atrás, eu ia atrás das pessoas que tinham uma guitarra porque quase não existia no Brasil, ia atrás das bandas, nem professor de guitarra existia em 1978, era tudo muito difícil. Ninguém sabia nada! O punk rock animou minha geração! As rádios de rock eram poucas e tocavam mais progressivo, Genesis, Yes, eu dormia, achava tudo um saco. No meio, do nada, tocava um rock pesado e eu achava maravilhoso! Fui comprar um pedal e acabei comprando um ‘phaser’. Só tinha dinheiro pra comprar um pedal e comprei o pedal errado!

O que quero dizer é que o mundo de antanho não tem nada a ver com o mundo de hoje. Então um de meus problemas é o “old school”, entendeu? Esteticamente e ideologicamente eu não apoio, quer copiar o ‘Kill ‘Em All’ ou ‘Raining Blood’, beleza! Mas não me peça para elogiar, porque eu tenho uma cabeça progressiva, tudo pra mim tem que evoluir, não pode se repetir. Meus parâmetros são altos!

entrevista carlos lopes dorsal atlantica

Foto Dorsal Alântica 

Eduardo: E essa sua cabeça fez você fazer uma coisa que praticamente não existia na época!

Carlos: Você tem que estar com a cabeça ligada no que está acontecendo no seu tempo. Eu comecei ouvindo Beatles, eles eram pura revolução e progressão e é isso que eu almejo de uma banda, quando não deu mais, eles pararam. Banda é foda, é negócio, você tem que entender que tudo é baseado em grana! Se você for tocar no exterior, você paga por tudo, inclusive jabá e corrupção. São coisas que acontecem nos bastidores! Dinheiro, poder, ambição e ego, né? Quando fomos abrir o Testament no Circo Voador, já tava um climão escroto, quando eu passei na porta do camarim, os caras estavam cantando “Welcome to the Jungle”, zoando, você nota, apesar de serem descendentes de mexicano e colombiano ou sei lá o que, eles são americanos, são basicamente idiotas, não conhecem o mundo. O técnico de som deles mexeu no nosso P.A. durante o nosso show pra nos sacanear. Eu tocava puto nessas situações! O Venom também, outros caras babacas! Eu valorizo o ser humano, caráter e dignidade!

Eduardo: E o Lemmy? Como foi abrir para o Motorhead?

Carlos: As coisas aconteciam muito rápido, eu estava ouvindo o meu primeiro disco do Motorhead, o ‘Bomber’ e 10 anos depois eu estava abrindo para eles no Gigantinho em Porto Alegre. Quando fomos passar o som, o Phil Campbell veio e me deu um abraço, o Lemmy e o Animal estavam vendo a passagem, foi foda! A gente não sabe se é artista ou fã! Hoje sou mais consciente que posso ser fã, mas tenho que valorizar o que eu faço. A gente tocou, o show foi legal mas os bastidores foram uma foda, uma bagunça homérica. Quando acabou o show tínhamos que devolver o equipamento que era emprestado e todo mundo sumiu, preocupados em pegar mulher. Eu estava sentado quando de repente aparece duas botas se aproximando, quando vi era o Lemmy com a mão cheia de anel segurando um copo de cerveja imenso e disse: “Eu reconheço quem trabalham duro. Parabéns pelo seu grande show!”, virou as costas e foi pegar alguém também! Eu pensava em trabalho o tempo todo.

entrevista carlos lopes dorsal atlantica

Foto Divulgação Carlos Lopes / Lemmy e Carlos Lopes

Eduardo: O legal é que naquela época as bandas abriam os shows por merecimento!

Carlos: Você sabe que a Dorsal parou de abrir show porque começaram a pagar jabás. Já ouvi de empresários que não nos chamariam mais porque agora tem uma geração que quer pagar. É assim que acontece!

Eduardo: E pagam mesmo! E vocês foram parar no Monster Of Rock a pedido do público né?

Carlos: Depois de abrir muitos shows gringos, houve uma lacuna onde a gente não conseguiu mais abrir show nenhum. Aí teve um abaixo-assinado com 35 mil assinaturas para que tocássemos no Monster Of Rock que acabou acontecendo em 1998. O produtor do festival me chamou e disse que estava impressionado com as 35.000 assinaturas e nos deixou tocar porque se o público queria, ele não seria contra, mas estávamos incomodando muita gente.

Quando a gente foi passar som tava lá o Glenn Hughes, depois um cara da produção me disse que tínhamos assustado o cara, que tinha ficado horrorizado e até nos colocou um apelido de “Noise Boys”, que achava que o perfil do festival seria hard rock, mas depois de nos ouvir, mudou o set list que seria mais focado em soul. 

entrevista carlos lopes dorsal atlantica

Foto Divulgação Carlos Lopes / Repertório no Monsters Of Rock do Dorsal Atlântica

Gegê: Você imaginava que se tornaria um nome tão importante no Metal nacional?

Carlos: Claro que não, porque não existia metal, não existia cena, não existia nada! Eu não imaginava o que eu iria fazer e nem a capacidade que eu teria de me desafiar, desafiar o óbvio e o entorno. Eu fui gravando os discos e a banda foi ficando popular. Quando gravamos ”Dividir e Conquistar” em 88, parte do público abandonou a banda, mas a banda cresceu. O “Antes do Fim” não era aceito em São Paulo, com o ”Dividir e Conquistar” a gente ganhou São Paulo, eles viram valor, mas a gente perdeu o público mais radical. Você pode classificar a banda como thrash metal, mas dentro da música da Dorsal você tem hard rock, hardcore, rock pesado, punk rock, música psicodélica e até soul music disfarçada! Eu prefiro chamar a banda de música da Dorsal ou progressiva, é a única forma de definir porque thrash metal não absorve tudo.

Gema: Vocês lançam o primeiro disco antes do Rock in Rio, né? Antes dos “metaleiros” ficarem popular no Brasil!

Carlos: Sim eu era jovem corria muito, ia atrás mesmo! Queria fazer uma coletânea meio paulista meio carioca, mas os paulistas não levaram fé e eu fiz só carioca junto com a Metalmorphose, que entrou porque eu estava sem opção e a banda era boa. Tinha uma coisa neles que eu gostava, que também tinha no Dorsal no ‘Ultimatum’, que era uma ingenuidade, eu gosto desse tipo de coisa e eu ouço isso no “Kill ‘Em All” do Metallica. 

Eu não ouço rock pesado há 20 anos e também não tenho interesse em conhecer porque estou mais preocupado em me aprofundar no Brasil, tanto que o ‘Pandemia’ não é apenas uma continuação do ‘Canudos’, que pra mim é um disco de rock brasileiro, que eu almejava mas não conseguia fazer. Eu tinha o conceito na cabeça, mas não conseguia realizar porque não era o momento. Eu sou muito orgulhoso do ‘Canudos’, é o meu disco favorito da Dorsal.

entrevista carlos lopes dorsal atlantica

Capa álbum Dorsal Atlântica ‘Canudos’ 

Eduardo: E esse novo trabalho vai seguir também uma temática?

Carlos: Sim! É a mesma busca por criar uma música pesada brasileira, que seja impossível qualquer pessoa do exterior fazer. O metal virou algo globalizado, onde todas as bandas querem atingir o primeiro mundo tocando com a mesma língua, com a mesma estética, mesma roupa e mesmo som de guitarra. Eu já tenho idade e esse papel não é mais pra mim. Eu não gosto de excursionar mais, não aguento mais palco, não quero mais participar dessa insanidade de agradar gringos, então o ‘Pandemia’ não será uma continuidade do ‘Canudos’ mas terão um elo de ligação. Estou escutando muita coisa e pesquisando muito como candomblé, umbanda e musica armorial, misturar tudo com uma bagagem de rock pesado e hardcore e dá pra fazer. 

Eduardo: E a formação será a mesma?

Carlos: Não, porque cada baterista tem características próprias, eu sempre escrevi pensando no baterista que estava comigo no momento, então eu escrevia o que ele podia me dar. Hoje eu adoto um método diferente, eu componho as músicas em casa, gravo tudo com bateria eletrônica e entrego para os músicos e falo pra aparecer no estúdio e gravar, alguns medram. Temos no máximo dois dias e meio para gravar tudo e sem ensaio. O último baterista que tocava comigo morreu, então perdi a conexão que eu tinha com ele que era muito forte, ele já sabia o que eu queria, o baterista agora vai depender de prazo e disponibilidade. É obvio que encherei o saco do cara para não ser convencional. 

Eduardo: E as histórias em quadrinhos como estão?

Carlos: Na campanha do Pandemia foi financiado o número 2 da minha revista ‘Tupinambah’. Meu primeiro sonho sempre foi ser desenhista, mas acabei virando jornalista e músico. Decidi voltar a desenhar porque a música já não estava me dando mais alegria. Estou tentando terminar a revista até Outubro e enviar pra gráfica. Esse ano três coisas serão feitas, os quadrinhos, as camisetas do time Guerrilha, com o nome de cada apoiador nas costas, e o disco. O projeto está andando e entrego tudo até o fim do ano! 

entrevista carlos lopes dorsal atlantica
entrevista carlos lopes dorsal atlantica

Revista em Quadrinhos Tupinambah

Eduardo: Carlos obrigado pela atenção e por nos atender, é uma honra falar contigo e estamos ligados em toda a tua arte!

Carlos: Muito obrigado e gostaria de dizer que minha preocupação é sempre o Brasil, nós que vamos fazer a diferença e um país grande, ou não!

Assista a entrevista na íntegra abaixo:

Vídeos

Discografia

dorsal atlantica discografia

‘Canudos’

Dorsal Atlântica

2017

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‘Imperium’

Dorsal Atlântica

2014

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‘2012’

Dorsal Atlântica

2012

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‘Straight ‘ 

Dorsal Atlântica

1996

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‘Alea Jacta Est 

Dorsal Atlântica

1994

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‘Musical Guide from Stellium ‘

Dorsal Atlântica

1992

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‘Searching for the Light’

Dorsal Atlântica

20141990

dorsal atlantica discografia

‘Dividir e Conquistar’

Dorsal Atlântica

1988

dorsal atlantica discografia

‘Antes do Fim

Dorsal Atlântica

1986

dorsal atlantica discografia

‘Ultimatum

Dorsal Atlântica / Metalmorphose

1985

marcelo gema

Gema

Gema. 46 anos dos quais 32 foram consumindo e tocando Rock n Roll.
Baterista, de bandas da cena de são Paulo e agora fazendo rock n roll na Espanha com a banda THE ROCK MEMORY.

eduardo rod

Edu Rod
Designer e músico apaixonado por arte e rock n’roll. Gaúcho de Porto Alegre, já morou em São Paulo, Nova York e atualmente reside em Madri, na Espanha. Em seu currículo como músico tem passagem como baixista das bandas Rosa Tattooada (Porto Alegre), Jungle Junkies (NY) e Monodrive (SP).

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